Painelistas de um recente fórum em Woodstock, na Filadélfia, EUA, convocaram os leigos católicos a agarrar as rédeas e definir o rumo do futuro da Igreja.
A reportagem é de Jerry Filteau, publicada no sítio National Catholic Reporter, 04-01-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
"Estamos nos tornando uma Igreja faça-você-mesmo" para os leigos, disse o padre jesuíta Thomas J. Reese (foto), um dos três membros seniores do Woodstock Theological Center, em Washington, que falou no fórum O Futuro da Igreja, organizado pelo Woodstock sobre as "fontes de esperança", realizado na St. Joseph's University, na Filadélfia, no dia 5 de dezembro.
A hierarquia católica dos EUA, hoje, está medrosa e defensiva, muito distante da hierarquia colaborativa e pastoralmente transformada que surgiu durante e após o Concílio Vaticano II, disse Dolores R. Leckey, ex-chefe do Secretariado para os Leigos, Família, Mulheres e Juventude da Conferência dos Bispos dos EUA, e uma notável escritora sobre espiritualidade.
Cabe aos leigos assumir a responsabilidade para onde a Igreja vai nos próximos anos, disseram Leckey, Reese, e o Pe. Raymond Kemp, sacerdote diocesano de Washington e diretor do programa Pregando a Palavra Justa de Woodstock. Os pronunciamentos foram feitos durante a sessão de duas horas com cerca de 300 católicos da região da Filadélfia.
Reese, cientista político, consultor de mídia nacionalmente conhecido e ex-editor da revista jesuíta America, disse: "Pessoalmente, como cientista social, eu tendo a ser pessimista quando olho para a Igreja. Mas, como cristão, acho que tenho que ser otimista. Isso faz parte do nosso DNA como cristãos. Afinal, a nossa religião é baseada em alguém que morreu e ressuscitou dentre os mortos".
Um recente estudo do Pew Forum mostrou que cerca de um terço dos adultos norte-americanos que foram criados como católicos já não são mais católicos, disse ele, e o número de sacerdotes e religiosos na Igreja dos EUA diminuiu drasticamente, com poucas e dispersas novas vocações.
"Aos 65 anos, sou considerado um padre jovem", disse ele, acrescentando que o sacerdócio católico pode ser a única profissão do país hoje em que alguém que morre de velhice ainda é considerado "jovem". Por causa da teologia sacramental da Igreja relacionada à ordenação, a falta de padres significa uma falta de acesso à Eucaristia e a outros sacramentos, enfraquecendo toda a estrutura institucional, disse Reese.
Ele afirmou que, para ele, o achado mais deprimente do estudo do Pew Forum foi que 71% dos ex-católicos disseram que haviam deixado a Igreja porque "'minhas necessidades espirituais que não foram correspondidas pela Igreja' – em outras palavras, nosso produto fundamental fracassou".
Outro importante fator negativo nas tendências de adesão dos católicos dos EUA, disse Reese, é que hoje, nos EUA, muitos dos que saem são mulheres.
"No século XIX, nós perdíamos homens na Europa. Nós não perdíamos mulheres", disse. "Hoje, nós estamos perdendo as mulheres também. As mães são mais importantes para a Igreja Católica do que os padres, porque elas são as que passam a fé para a próxima geração. São elas que ensinam as crianças a rezar, que respondem às suas perguntas sobre Deus etc. As mulheres são absolutamente essenciais. Se perdermos as mulheres, podemos muito bem fechar a loja. E, por isso, o pior disso tudo é que, quanto mais uma mulheres se educa, mais alienada ela tende a se tornar da Igreja Católica".
Reese disse que os líderes da Igreja, ao culpar a pecaminosidade, o dissenso, a falta de compromisso ou outros fatores pelo êxodo dos católicos da Igreja, estão ignorando um grande problema. "Se fôssemos uma loja, diríamos que estamos culpando os clientes – e essa não é uma boa forma para fechar as contas", disse ele.
Ele disse que uma atitude acolhedora, implementada em práticas de boas-vindas concretas, está faltando na maioria das paróquias católicas, e essa é uma das grandes fraquezas da prática católica dos EUA hoje.
"Quando foi a última vez que você entrou em uma igreja católica e foi realmente acolhido?", perguntou. "Nossas igrejas e nossas liturgias são chatas. Isso, penso eu, mais do que a teologia, é o que está afastando o nosso povo da nossa Igreja".
"O que você precisa é de boa música, boa pregação, programas para crianças e uma comunidade acolhedora", disse. "Se você tiver isso, você vai ter uma igreja cheia".
Ele chamou a Igreja Católica hoje de "um monopólio preguiçoso", em torno do qual as Igrejas evangélicas "estão correndo em círculos".
Como sinais de esperança, disse ele, a Igreja "é muito melhor hoje do que era" na década de 1950 e é uma Igreja "que sempre muda".
Ele citou o retorno ao conhecimento bíblico e à espiritualidade entre as principais causas de esperança da Igreja Católica hoje.
O foco católico na justiça social atrai os jovens católicos, "especialmente quando esse trabalho não é visto apenas como uma espécie de apêndice ao Cristianismo, como ser católico, mas está integrado na nossa espiritualidade, como parte do que somos, por isso torna-se parte de quem nós somos como cristãos – para muitos jovens católicos, isso se torna atrativo", explicou.
Sobre as perspectivas imediatas da Igreja para o futuro, "talvez Deus sabe o que está fazendo", disse. "Se você não tem clero, talvez o trabalho seja seu".
Leckey e Kemp tocaram notas similares sobre a responsabilidade dos leigos pelo futuro da Igreja.
Leckey, que recentemente terminou um livro, The Laity and Christian Education, da série "Redescobrindo o Vaticano II", da editora Paulus dos EUA, disse que o Concílio Vaticano II da década de 1960 é uma das principais razões para a sua esperança para o futuro da Igreja.
"O que aconteceu ali foi uma monumental conversão da consciência" entre os 2.500 bispos católicos do mundo, disse ela, e uma área-chave disso foi o reconhecimento do papel dos leigos, em virtude do seu batismo, na missão da Igreja e na propagação do Evangelho no mundo.
Ela contrastou a visão conciliar dos leigos com a visão pré-conciliar predominante, melhor expressa pelo Papa Pio X no início do século XX, quando disse: "Quanto aos fiéis leigos, eles não têm nenhuma outra obrigação senão deixar-se conduzir e, qual dócil rebanho, seguir os Pastores".
Além de rever a Igreja como Povo de Deus peregrino, o Concílio sublinhou a vocação universal à santidade e mudou o curso da narrativa da vida da Igreja, tornando-a mais bíblica e liturgicamente centrada, afirmou.
Hoje, observou ela, 85% dos ministros das paróquias dos EUA são leigos, sendo que a maioria são mulheres.
Kemp disse que a chave para um futuro de esperança para a Igreja é uma paróquia viva – uma paróquia que acolha as pessoas e convide-as a contribuir com seu tempo e seus talentos. Ele citou a paróquia de St. Patrick, em Chicago, como um bom exemplo, que tem cerca de 120 membros nos grupos de pastoral e atrai jovens de toda a cidade.
Outro sinal de esperança para o futuro da Igreja nos Estados Unidos, disse, é o seu envolvimento em obras de caridade e de justiça.
"Nós temos uma história para contar, que atrai as pessoas que não são católicas", disse. "Onde estamos? Estamos nas fronteiras. Onde estamos? Estamos no hospital de Aids na África. Onde estamos? Somos aqueles que estão acompanhando os ilegais ao longo do processo. Onde estamos? Somos aqueles que estão nas prisões. Somos aqueles que estão construindo casas fora dos centros de detenção, para que as famílias possam se reunir com seus parentes antes de serem deportados. Onde estamos? Como Igreja, educamos, alimentamos, abrigamos, vestimos, reassentamos aqueles que encontram seu caminho aqui do que qualquer outra ONG deste país".
Esse é o tipo de instituição que atrai os jovens que querem fazer a diferença no mundo, disse.
Durante uma sessão de perguntas e respostas depois da apresentação, os três painelistas salientaram a necessidade de que os leigos tomem a iniciativa, se quiserem ver as coisas acontecer na Igreja.
Quando foi questionada sobre como os leigos podem estabelecer um diálogo com seus bispos sobre temas que lhes interessam, Leckey sugeriu que a crescente colaboração de religiosos e leigos – muitas comunidades religiosas estabeleceram programas associados aos leigos – poderia servir como um modelo e uma forma de desenvolver esse diálogo.
É difícil fazer com que os bispos de hoje entrem nesse diálogo, porque eles não confiam nos leigos como fizeram depois do Concílio, disse ela.
"Nossos bispos estão com medo", disse. "Você não age defensivamente assim a menos que esteja morrendo de medo. Suas defesas estão levantadas. Elas não estavam levantadas nos dias logo depois do Concílio".
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